Como programas de educação cívica podem contribuir para aumentar a confiança nas instituições

Claudia Afanio

Este texto ensaia a compreensão acerca de alguns fatores de conexão entre educação política e comportamento político.

A confiança nas instituições é um dos comportamentos mais esperados dentro de uma democracia moderna, considerado uma das bases de sustentação desse regime. No Brasil, segundo Moisés e Carneiro (2008), existe uma síndrome de desconfiança e indiferença frente à política como um todo. Essa desconfiança faz com que as instituições percam sua importância, dando margem a traços autoritários enraizados em nossa cultura política. O problema gerado pela desconfiança em relação às instituições reside na dificuldade para se realizar a coordenação social, que seria o papel do Estado moderno, e comprometeria a cooperação social, meio para o aperfeiçoamento das políticas públicas e iniciativas estatais (Giddens, 1990; Norris, 1999; Moisés e Carneiro, 2008; Offe, 1999).

As pesquisas têm demonstrado que a confiança nas instituições está em declínio na maioria dos países do mundo (Kligemann, 1999), incluindo o Brasil (Moises, 2008). Segundo pesquisa realizada pelo IBOPE, a confiança do brasileiro nas instituições é a mais baixa desde 2009, como mostra a tabela abaixo:

Tabela 1 – Índice de Confiança Social (ICS): % de quem confia nas instituições

Fonte: elaborado com dados do IBOPE (2020).

Para alterar esse estado, muitas democracias criam programas ou projetos educacionais para o desenvolvimento de um comportamento político de confiança que são conhecidos como formas de educação política ou cívica.

A relevância do tema se destacou internacionalmente nos anos 2000 com um corpo teórico com a ambição de entender em profundidade os mecanismos pelos quais educação e política se conectam. Essa agenda de pesquisa atrai pesquisadores como Robert Barro (Havard), Edward L. Glaeser (Harvard), D. Sunshine Hylligus (Harvard), Daron Acemoglu (MIT), David Campbell (Notre Dame), Amparao Castelló-Climent (Valencia), Elizabeth Frazer (Oxford), dentre outros.

Um exemplo de programa de educação cívica é o do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR), denominado Parlamento Jovem. O programa abrange as escolas do estado do Paraná, públicas e privadas, na capital e no interior e sua metodologia e conteúdo são desenvolvidos em duas etapas: 1) etapa do processo eleitoral; 2) etapa do processo legislativo. O Parlamento Jovem é o objeto da tese da autora deste comentário, que sustenta, como hipótese, que as mudanças de atitudes proporcionadas pelo PJ em relação à confiança nas instituições políticas mudam mais rapidamente quando o participante percebe e coloca em prática suas novas atitudes em ambientes concretos, como nas câmaras municipais.

Pesquisas sobre confiança nas instituições têm três diferentes abordagens: uma perspectiva sociopsicológica, que analisa a evolução da personalidade de cada pessoa, um modelo sociocultural, voltado à análise da socialização política, e um modelo cujo foco é o desempenho institucional com fator preponderante para a conformação da confiança política (Baquero, 2003). A tese da autora, ainda em produção, foca no modelo sociocultural, pois incorpora em sua análise variáveis de perfil social dos participantes do PJ e de fatores de socialização política que podem se relacionar ao comportamento político.

No campo de estudos sobre educação cívica, o trabalho realizado por Fuks & Casalecchi (2012) demonstra que programas institucionais de educação política são capazes de mudar as atitudes e de proporcionar maior conhecimento político para seus participantes. Os autores referem-se a essas mudanças como um “ganho”, na medida em que, mediante a obtenção de maior conhecimento político, os participantes do projeto passam a valorizar os esforços das instituições políticas e demonstrar maior confiança nelas. Mas, durante muito tempo, a literatura sobre socialização política foi cética em relação a mudanças. Foi a partir do trabalho de Almond e Verba, The Civic Culture (1963), que a cultura política e a sua mudança tornaram-se objeto das mais variadas pesquisas e estudos que buscam estabelecer um elo explicativo entre os conjuntos de atitudes, crenças e valores políticos e seus efeitos sobre o regime democrático.

Referências

ALMOND, G.; VERBA, S. The Civic Culture: Political Attitudes and Democracy in Five Nations. Princeton: Princeton University Press, 1963.

FUKS, M.; CASALECCHI, G. Trust and political information: attitudinal change among participants in the Youth Parliament in Brazil. Brazilian Political Science Review, v. 6, n. 1, 2012.

GIDDENS, A. Modern Social Order. London: Polity Press, 1995.

KLIGEMANN, H. D. Mapping Political Support in the 1990s: A Global Analysis. In: Norris, P. (Ed.). Critical Citizens: Global Support for Democratic Government. New York: Oxford University Press, 1999, p. 31-56.

MOISÉS, J. A.; CARNEIRO. Cultura Política, Instituições e Democracia: lições da experiência brasileira. Revista Brasileira de Ciências Sociais, 2008.

NORRIS, P. Critical citizens: global support for democratic governance. Oxford: Oxford University Press, 1999. OFFE, C. How can we trust our fellow citizens? In: WARREN, M. (org.). Democracy and trust. Cambridge: Cambridge University Press, 1999.