O pesquisador Miguel Quessada analisou a propaganda partidária gratuita do Antigo PRB e atual Republicanos em dois períodos distintos a fim de verificar se houve um reposicionamento assim como ocorreu no manifesto partidário.
A PPG teve origem na Lei Orgânica dos partidos em 1965, quando concedeu pela primeira vez aos partidos brasileiros o direito de transmitir de forma gratuita os congressos e encontros em cadeia de rádio e televisão (TENORIO, 2011). A PPG, devido uma alteração da lei, foi extinta de 2018 a 2021, voltando a cena no ano de 2022 com a promulgação da Lei 14.291/2022.
Apresento a comunicação partidária como um caso de gerenciamento de crise, visto que que é uma instituição que passa por uma crise de representação, partidária e democrática. (CASTELLS, 2002, 2019; PRZEWORSKI, 2020; CANCLINI,1997, 2015; MANIN, 1995, 2013; MAIR, 2003; BARQUERO; CASTRO; RANINCHESKI, 2016).
O PRB passou em um reposicionamento de imagem e em agosto de 2019 ganhou o nome de Republicanos. Tanto no estatuto do PRB como do Republicanos, não há menção de programa, apenas o rito de direitos, deveres, processo eleitoral. A linha ideológica do partido é manifestada no programa do partido. Enquanto se chamava PRB, havia princípios genéricos que combatia todo tipo de discriminação, proteção aos segmentos frágeis da sociedade. A vantagem desse tipo de programa é que por ser genérico facilita alianças, sem comprometer a identidade ideológica. Já como Republicanos, a linha adotada ficou bem mais visível: “somos um movimento político conservador, fundamentado nos valores cristãos, tendo a família como alicerce da sociedade, preservando a soberania nacional, a livre iniciativa e a liberdade econômica” (REPUBLICANOS, 2019). Ao longo do manifesto, há vários itens que promovem essa guinada ao conservadorismo: meritocracia nas relações de trabalho, apoio ao casamento tradicional, defesa da vida desde a sua concepção, educação básica não-ideológica, cobrança nas universidades públicas, revisão do código penal (CERVI, QUESSADA, 2023).
O Republicanos à semelhança do que fez em seu manifesto partidário, também adequou a PPG à sua linha ideológica e identificar as estratégias discursivas utilizadas. Metodologicamente, replica-se e adapta as variáveis aplicadas por Tenório (2011) a saber: ênfases no partido, debate de uma temática específica, ênfase em mandato e mandatário, ataque e pré-campanha eleitoral, além de fazer uma análise descritiva do conteúdo das inserções partidárias de 2011 e as de 2022 registradas no canal do You Tube “Republicanos”. As inserções de 2011 são as mais antigas registradas na plataforma ao passo que as de 22 além de serem as primeiras após a volta do PPG, também são as primeiras como o novo nome do partido.
Em 2011, foram veiculadas 13 inserções (30 segundos), sendo cinco com ênfases ao partido, seis no debate de uma temática específica (mulher) e duas na ênfase no mandato (programa nacional do microcrédito e frente nacional do Idoso). De forma geral, o partido é apresentado como novo, que apela para um futuro melhor a fim de construir um Brasil dos nossos sonhos, apelando sempre ao eleitor que ele se filie à agremiação. A temática cristã é mostrada por Crivella, mas com mensagens de acolhimento tais como: “Amais uns aos outros”, “Somos Todos Iguais” e “Conhecereis a verdade e ela vos libertará”. Há mensagens de modernidade e sustentabilidade. A ênfase ao partido é a temática que mais aparece e não há ataque nem elogio ao governo, mas menção ao vice-presidente José Alencar. Nas mensagens referentes às mulheres, são os homens que predominam. Já o programa de partidário do PRB (10 minutos), a ênfase predominante é no partido que faz menção ao apoio ao governo Lula e se orgulha de ser o partido mais fiel ao governo Dilma, mostrando apoio aos programas de governo e traz ao debate temas como educação, mulher sistema prisional feminino, além de focar no trabalhador.
Em 2022, após ficar a PPG ficar extinta por quatro anos, ela retorna de forma proporcional aos partidos. Não há mais o tempo de 10 minutos, mas as inserções continuam. Agora, o Republicanos com uma nova identidade visual e nono manifesto partidário apresenta-se ao eleitorado. Foram 10 inserções diferentes, divididas da seguinte forma: 5 ênfases ao partido, 4 sobre temáticas (mulheres, agro, educação) e uma sobre mandato (Tarcísio de Freitas). Em comparação ao ano de 2011, a temática relacionada ao partido corresponde a 50% das inserções, o que mostra um apelo maior à agremiação. Há um número maior de deputados e senadores, o que torna as inserções mais diversificadas. Isso é explicado pela expansão do partido que diferente de 2011, conta com dezenas de parlamentares. Quanto ao conteúdo, o Republicanos enfatiza que ele é o verdadeiro partido conservador e a casa da mulher brasileira, defende os valores da família, cristãos e faz um apelo à tradição. Há o apoio claro ao presidente Jair Bolsonaro, tradicionalismo cristão e soberania nacional.
A mudança no discurso da PPG mostra que o Republicanos se alinhou ao que pretende ser: o verdadeiro partido conservador. A modernidade e o futuro deram lugar à tradição. E assim como aconteceu um reposicionamento de imagem e de estatuto, a comunicação política mostrou-se coerente com a proposta conservadora defendida pela legenda. Apesar de defender a tradição, o discurso do partido em 2022 é alinhado ao do presidente Bolsonaro. Sem conhecer a história e comunicação partidária de outrora, dificilmente alguém associaria o partido ao PT, como ele mesmo fez no passado. O Republicanos seguiu a tendencia dos partidos de direita ao fazer um reposicionamento e embora se distancie daquilo que defendeu no passado, ele mostrou-se coerente ao defender as pautas pregadas, mostrando que o reposicionamento foi além de engodo de marketing, mas sim uma real mudança de posicionamento.
Referências:
BARQUERO, M.; CASTRO, H. C.; RANINCHESKI, S. (Des)confiança nas instituições e partidos políticos na constituição de uma democracia inercial no Brasil: o caso das eleições de 2014. Política e Sociedade. v.15, n. 32, 2016. Disponível em: https://cutt.ly/vhJ3MMZ . Acesso em: 17 jun. 2022.
CANCLINI, Nestor Carcia. Consumidores e Cidadãos: conflitos multiculturais da globalização. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1997.
CANCLINI, Nestor Carcia. Entrevista concedida a Carme Ferré-Pavia, Gisella Meneguelli e Esmeralda Monteiro. Revista Cadernos de Estudos Sociais e Políticos, v4, n.8, jul-dezembro, 2015.
CASTELLS, Manuel. 2002. O poder da identidade. 3ed. São Paulo: Paz e Terra, 2002. 530p. (A Era da Informação: Economia, Sociedade e Cultura ; v.2).
CASTELLS, Manuel. 2018. Ruptura: A crise da democracia liberal. Rio de Janeiro: Zahar, 2018.
CERVI, Emerson; QUESSADA, Miguel. Quem vê cara não vê coração: uma discussão sobre mudanças nas identidades visuais dos partidos políticos na democracia brasileira. Anais Compolítica, 2023.
MAIR, P. Os partidos políticos e a democracia. Análise Social, Lisboa. V.38, n.167, 2003.
2003.
MANIN, Bernard. As metamorfoses do governo representativo. RBCSR, v. 10, n. 29, p. 5-34.1995.
PRZERWORSKI, Adam. 2020. Crises da Democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 2020.
TENORIO, Propaganda partidária gratuita: dilemas e implicações sobre os partidos políticos e a comunicação política brasileira. Compolítica, 1(2), 85-108, 2011.
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