Qual é a proporção de fala das mulheres em segmentos do HGPE?

Naiara Sandi de Almeida Alcantara e Alessa Coelho Lauriano

Tradicionalmente, as candidaturas femininas são numericamente inferiores às masculinas, isto é, candidatam-se menos mulheres do que homens para disputas eleitorais. Apesar do espaço feminino ainda ser diminuto na esfera política, o que queremos responder nesse texto é: quando candidatas, qual é proporção de fala das mulheres em relação à dos homens?

A autora Angela Davis (2016, p. 45), em seu livro “Mulheres, raça e Classe”, expõe que, durante o século XIX, a “mulher perfeita era retratada na imprensa, na nova literatura popular e até nos tribunais como a mãe perfeita. Seu lugar era em casa – nunca, é claro, na esfera política”. Esse pensamento tornou-se socialmente estrutural, ao longo das décadas.

De maneira geral, ainda que não de forma uniforme, as mulheres organizaram-se e travaram lutas com pautas específicas, em busca de uma série de direitos, como o de ocupar mais espaço junto à elite política, e dessa forma legislar em causa própria. Para tanto, tornou-se imperioso ao movimento feminista desmistificar construções sociais machistas e sexistas que se perpetuaram ao longo das décadas, à exemplo, do local mais adequado ao trabalho feminino ser o doméstico. Diante desse tipo de consciência de gênero, muitas mulheres deixaram de se dedicar somente à esfera privada e ingressaram no mercado de trabalho nas mais diversas áreas, inclusive na política.

Ainda em relação à participação feminina em âmbito político, Alcantara e Canal (2020) demonstram que as mulheres, ao longo da história, foram desprivilegiadas em todos os aspectos sociais, mas em especial no que tange ao ambiente de trabalho e político, a exemplo da conquista do voto, que para mulheres somente aconteceu há menos de um século. A partir de um primeiro direito adquirido, o de votar, várias lutas precisaram ser travadas, e nota-se que efeitos positivos foram surgindo, como as cotas na política, contudo, tais medidas paliativas não foram suficientes para deslegitimar a hierarquia da elite política constituída pelo homem branco.

Embora a elite política ainda seja majoritariamente masculina, é dado que a participação das mulheres tem aumentado desde as últimas décadas. Se por um lado as mulheres lutam e passam a ocupar espaços que antes eram considerados somente masculinos, por outro, permanecem sendo alvos da intolerância masculina, não só para acessar espaços políticos, mas nos mais diversos âmbitos sociais, inclusive o doméstico, exemplo evidente disso são os feminicídios, em que mulheres são assassinadas tão somente por serem mulheres. No Brasil, durante a atual pandemia, houve um crescimento nos números de mulheres assassinadas saltando de 117 vítimas em março/abril de 2019 para 143 vítimas em março/abril de 2020 em 12 estados analisados pelo Fórum brasileiro de Segurança Pública (2020).

Os alarmantes dados sobre feminicídio no Brasil demonstram como as mulheres ainda estão submissas às mais diversas mazelas sociais. Ademais, torna-se cada vez mais importante que as mulheres ascendam a cargos públicos e políticos, e possam lutar para ter suas demandas supridas, afinal, somente elas compreendem a necessidade de leis específicas para as mulheres. Neste sentido, o objetivo não é tornar esse grupo privilegiado, mas ao contrário, para torná-lo menos desigual em relação aos direitos que os homens já possuem.

Diante desse cenário e utilizando a metodologia da Análise de Conteúdo com o modelo adotado pelo grupo de estudos Comunicação Política e Opinião Pública da (CPOP), nosso objetivo neste texto é compreender como os/as candidatos/as a deputado/a federal em 2018 se distribuem em relação ao sexo e à fala durante suas campanhas. A análise descritiva da associação entre as duas variáveis (sexo e presença de fala) no Horário Gratuito de Propaganda Eleitoral (HGPE) pode ser representada pela tabela 1.

Tabela 1 – Relação entre a fala e o sexo do candidato dos deputados federais em 2018

Fonte: CPOP (2020).

Com os dados, verificamos que ambos os sexos têm mais presença de fala (1.486) do que ausência (414). Todavia, sempre haverá mais homens falando do que mulheres, porque, quantitativamente, os homens representam quase três vezes a quantidade de mulheres no HGPE. Além disso, como nossa intenção é avaliar a presença ou ausência da fala em relação ao sexo, rodamos uma análise descritiva de associação com a porcentagem nas linhas, para verificar a fala proporcionalmente, dessa forma, constatamos que as mulheres falam 0,5% a mais do que os homens.

A diferença da presença de fala demonstra que apesar das mulheres falarem mais, é uma variação muito pequena. Denota-se que mesmo que as mulheres estejam sub-representadas em candidaturas femininas, ainda assim, durante a campanha são elas que apresentam suas falas, utilizando menos falas de outros agentes políticos para legitimar a própria campanha. Assim sendo, é imperioso destacar que o horário político demonstra que as mulheres, quando capacitadas para participação política, exercem seu discurso político.

Referências:

ALCANTARA, N.S.A.; CANAL, G.C. O que pensam os/as brasileiros/as sobre as mulheres na política: análise da opinião em relação à participação feminina na política entre 2008 e 2018. in: TOMAZONI, L. R.; LEME, L.A.V.P., PRATA, M. ABIKO, P. (org). Mulheres e o direito: Um chamado à real visibilidade. Curitiba: Sala de aula crimina, 2020. p.194-211.

DAVIS, A. Mulheres, raça e classe. Tradução de Heci Regina Candiani. São Paulo: Boitempo, 2016.

PÚBLICA, Fórum brasileiro de segurança pública. Violência doméstica durante a pandemia de covid-19. 2 .ed. Disponível em: <https://forumseguranca.org.br/wp-content/uploads/2020/06/violencia-domestica-covid-19-ed02-v5.pdf>. Acesso em 04 de julho de 2020.