As pesquisadoras Maíra Orso, Júlia Frank e Nayara Alcântara analisam os padrões de compartilhamento de informações, especialmente URLs e retweets, por parte de atores políticos de direita no Twitter durante as eleições de 2022 no Brasil. A pesquisa visa identificar a origem das informações compartilhadas, os responsáveis por sua produção e os principais emissores dessas informações. Também busca entender como essas páginas atuam durante o período eleitoral, investigando se há diferenças em suas estratégias comunicacionais e como ocorrem as articulações nesse ambiente digital durante as eleições

O Twitter, desde seu lançamento em 2006, tornou-se uma ferramenta essencial na comunicação política, sendo adotado em campanhas eleitorais como a de Barack Obama em 2008 e as eleições brasileiras de 2010 (Cervi & Massuchin, 2011; Marques et al., 2013). Mais recentemente, tem sido utilizado não apenas para conquistar votos, mas também para moldar e promover a imagem política de candidatos, como exemplificado por Jair Bolsonaro em 2018 (Pereira, 2021; Massuchin et al., 2021). No entanto, essa plataforma também tem sido associada à polarização e radicalização discursiva, alimentando bolhas de opinião que reforçam crenças pré-existentes (Sunstein, 2017).

No contexto brasileiro, as mídias sociais, especialmente o Twitter, desempenham um papel significativo na mobilização política, como demonstrado pelos protestos de 2013 e pelas eleições de 2018 (Miskolci, 2021; Tatagiba, 2014; Oliveira & Silva, 2023; Araújo & Santos, 2022). Apesar de sua importância na promoção do engajamento cívico, o Twitter também se tornou um terreno fértil para a disseminação de desinformação e discursos extremistas, particularmente por grupos de direita (Araújo & Oliveira, 2020). Essa plataforma permite a rápida disseminação de informações, fortalecendo atores políticos e impulsionando os fluxos de informação e conhecimento nas redes sociais (Alves, 2011; Araújo, 2014).

O estudo das fontes de informação no Twitter vai além de simplesmente rastrear URLs, pois os atores políticos que compartilham esses conteúdos desempenham um papel crucial na estruturação do debate político online (Lemos, 2020; Lycarião, 2014; Moraes & Adghirni, 2012; Silva & Mundim, 2015). Além da imprensa tradicional, as mídias alternativas, ativistas e políticos são fontes significativas de informação na dinâmica da troca de informações online (Massuchin et al., 2021; Joathan & Alves, 2020; Recuero et al., 2020). As tecnologias, como plataformas e algoritmos, também desempenham um papel na organização e disseminação da informação, muitas vezes tornando difícil verificar a autenticidade e a confiabilidade dos conteúdos (Hepp, 2020; Bennett & Livingston, 2018). Assim, compreender as fontes de informação é essencial para entender a dinâmica da disseminação de informações e a circulação de desinformação nas mídias digitais.

Dito isto, neste estudo, a metodologia empregada é a Análise de Conteúdo aplicada aos tweets de 10 páginas de direita do Twitter. Os dados foram extraídos usando a API da plataforma de 15 de agosto a 30 de outubro de 2022, totalizando 3.590 tweets, dos quais 1.429 (39,86%) continham links ou retweets. Esses foram sistematizados em um banco de dados e categorizados quanto ao tipo de link e à origem do conteúdo. Os tipos de link incluem sites jornalísticos, YouTube, sites institucionais, entre outros. A origem do conteúdo foi categorizada em imprensa tradicional, blogueiros, políticos de direita, entre outros. Antes da categorização completa, houve um teste de confiabilidade que resultou em 100% de concordância entre as codificadoras.

Resultados: 

Neste estudo, de um total de 3.590 tweets coletados, 720 continham URLs. A análise focou apenas nessas postagens, visando entender as fontes de informação mobilizadas pelas páginas selecionadas. Dos 1.429 tweets codificados, 9,4% foram de páginas de ativistas de direita, 35,8% de páginas de políticos de direita e 54,9% de páginas impessoais de ativistas de direita. A maioria dos links compartilhados (33,9%) era do próprio Twitter, sugerindo uma concentração de informações dentro da própria plataforma. Isso evidencia uma tendência às bolhas informativas e à disseminação de mensagens diretas e de fácil assimilação pelos seguidores.

Tabela 1 – Distribuição das plataformas para onde a URL direciona

Tipo/origem do linkAbsolutos%
Blogs10%
Outros (forms, sites de vendas, etc)10,1%
Sites de políticos30,2%
Link para grupos/canais de Whatsapp/Telegram/Facebook/Instagram80,6%
Não identificado100,7%
Sites de rede de notícias da alt-rigth130,9%
Sites jornalísticos231,6%
YouTube17712,4%
Conteúdo do próprio Twitter48433,9%
Não tem link70949,6%
Total Geral1429100%

Fonte: Autoras, 2024

A respeito da distribuição dos emissores, conforme tabela 2, vê-se que 492  (34,4%) dos tweets não eram retweets (sendo assim, obrigatoriamente continham URLs). Além disso, a maior parte dos retweets são originalmente de políticos de direita (9,9%) ou de blogueiros (3,2%); demonstrando uma tendência maior de páginas pessoais retweetarem informações de outras fontes, e páginas impessoais de publicarem seus próprios conteúdos e URLs. 

Tabela 2- Distribuição das contas que possuem RT e suas origens

Origem da contaAbsolutos%
Instituições (Senado, STF, Polícia Militar, etc)10,1%
Políticos de esquerda/centro10,1%
Rede de imprensa alternativa (folhapolítica/GazetaBrasil)50,3%
Imprensa60,4%
Contas impessoais de ativismo de direita412,9%
Blogueiros463,2%
Políticos de direita1419,9%
Não tem RT49234,4%
Conta de cidadãos ativistas de direita69648,7%
Total Geral1429100%

Fonte: Autoras, 2024

A partir do próximo gráfico, passa-se a dar atenção à variável que qualifica a origem das URLs compartilhadas pelas 10 contas do Twitter, ou seja, diz respeito ao tipo de emissor. O gráfico 2 revela – desconsiderando os RTs, que falaremos adiante – que entre os links, as contas tendem a compartilhar com maior frequência informações produzidas por outros políticos de direita. De um montante de 720 URLs, 349 (48,4%) são oriundas da conta de algum ator representante da elite política de direita. Esse dado reforça em alguma medida a ideia de que as redes se constroem em bolhas e que muitas informações se repetem dentre membros do grupo, já que neste caso o que um ator de direita diz é reiterado por outro a partir de sua fala. Ademais, permite perceber integração entre os membros da direita já que convergem nos argumentos (Parieser, 2011).

Conforme o gráfico 2, nota-se que a maior parte dos tweets não possuía link, contudo, dentre o que possuíam, a origem dos links era majoritariamente de políticos de direita, seguido por contas de cidadãos comuns – mas que atuam ativamente em prol das agendas políticas mais a direita no espectro político, fazendo parte da polifonia de vozes da direita, e confirmando a relação com a afirmação de que esses atores funcionam como mediadores nas conversações online (Lemos, 2020; Lycarião, 2014; Moraes, Adghirni, 2012; Silva, Mundim, 2015).

De maneira inversa aos dados de distribuição das plataformas para onde o tweet direciona, nessa variável a categoria de contas de cidadãos ativistas de direita é mais alta do que as contas impessoais de ativismo. Neste caso, os perfis de ativistas somam 69 tweets (4,8% dos tweets e 8,6% dos links), ou seja, depois da elite política são os ativistas que tendem a repercutir mais como emissores da informação dentro da arena da direita. Assim como reforçam Eddinggton (2018), Santos (2016) e Ekman (2014), além dos ativistas, as redes de imprensa alternativa de direita também promovem uma alternativa à comunicação política oficial e às redes de imprensa tradicional, desviando a centralidade de informações para canais hiperpartidários de direita (Recuero et al, 2021; Massuchin et al, 2021; Santos, 2016). Da amostra geral com URLs e RTs, o gráfico abaixo demonstra que essa rede (como a @folhapolítica e @GazetaBrasil) representa 3,9% (N=56) de um montante de 1429, e se olharmos apenas para os links isso significa 7,7% dos conteúdos compartilhados pelas contas. E contas impessoais de ativismo de direita aparece logo em seguida com 3,7% (N=53) dos tweets codificados.

Gráfico 1- Distribuição dos emissores dos tweets

Fonte: Autoras, 2024

Até aqui, portanto, tem-se diferenças quantitativas na distribuição das plataformas preferíveis para compartilhar informações e, também, no tipo de fonte que dá origem à informação. Quando analisamos, porém, o cruzamento das plataformas com a origem da informação, obtemos o resultado de qual emissor está mais associado à determinada plataforma. Por exemplo, quando conteúdos com links do próprio Twitter são compartilhados, são majoritariamente conteúdos originados de ativistas de direita (81%) seguido dos políticos da direita (40%). Já quando tweets que direcionam ao YouTube são postados, eles são originários de páginas impessoais de ativismo (15%) e de políticos de direita (10%). O que podemos analisar nessa relação é a tendência de políticos e ativistas de publicarem e criarem seu próprio conteúdo, e a tendência das páginas impessoais de recorrerem a uma fonte secundária.

Tabela 4- Cruzamento das plataformas com a origem da informação (em %)

TIPOS DE LINKSAtivista de direitaPágina impessoal de ativismo de direitaPolítico de direitaTotal Geral
Blogs0%0%0%0%
Conteúdo do próprio Twitter81%22%40%34%
Link para grupos/canais de Whatsapp/Telegram/Facebook/Instagram1%1%0%1%
Não identificado0%1%0%1%
Não tem link10%60%44%50%
Outros (forms, sites de vendas, etc)0%0%0%0%
Sites de políticos0%0%1%0%
Sites de rede de notícias da alt-rigth3%1%1%1%
Sites jornalísticos1%0%4%2%
YouTube4%15%10%12%
Total Geral100%100%100%100%

Fonte: Autoras, 2023

.

Por meio da tabela 5, nota-se que a maior parte dos links são compartilhados por páginas de políticos de direita, que também são os emissores das informações contidas nesses links (39%). Isso demonstra uma possível necessidade de autoafirmação por meio desses políticos, e de plataformização das fontes de informação (Santos, 2021). Indicando também que as URLS demonstram a utilização da esfera virtual como meio de propagação de conteúdo para a militância e de construção de uma agenda política (Santos et al, 2014). A análise das URLs compartilhadas revela uma tendência das contas a compartilharem informações produzidas por políticos de direita, reforçando a ideia de centralidade de informações dentro de um determinado grupo (Eddinggton, 2018). 

Os sites de notícia estando com apenas 3% de ocorrência demonstra novamente o que Alves dos Santos Júnior (2021) chama de desarranjo da visibilidade: novas vozes ganhando audiência, e uma baixa visibilidade advinda de veículos de imprensa tradicionais, causando um desarranjo de informação.

Tabela 5 – Cruzamento de quem utiliza as fontes (em%)

ORIGEM DOS LINKSAtivista de direitaPágina impessoal de ativismo de direitaPolítico de direitaTotal Geral
Blogueiros0%0%1%0%
Conta de cidadãos ativistas de direita23%3%3%5%
Contas impessoais de ativismo de direita4%5%2%4%
Imprensa tradicional3%1%6%3%
Instituições (Senado, STF, Polícia Militar, etc)0%0%0%0%
Não disponível0%15%1%9%
Não tem link12%60%44%50%
Outro ou mais de um3%0%1%1%
Partidos Políticos1%0%0%0%
Políticos de direita38%12%39%24%
Políticos de esquerda/centro0%0%2%1%
Rede de imprensa alternativa (folhapolítica/GazetaBrasil)16%3%1%4%
Total Geral100%100%100%100%

Fonte: Autoras, 2024

Os resultados mostram uma predominância de conteúdos compartilhados por políticos de direita, sugerindo a formação de bolhas informativas na plataforma. Além disso, evidenciam diferenças significativas entre os tipos de emissores de conteúdo, como políticos, ativistas e páginas impessoais de ativismo. A presença marcante de contas de ativistas e redes de imprensa alternativa de direita destaca sua importância como mediadores na conversação online. Os resultados estatísticos destacam a influência dos emissores na escolha do tipo de conteúdo compartilhado. O estudo conclui sugerindo que pesquisas futuras explorem mais a dinâmica das interações políticas nas redes sociais, considerando diferentes plataformas e atores envolvidos, além de investigar os efeitos dessas interações na formação da opinião pública e no processo político como um todo.


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