Alguns dados sobre a presença das mulheres no Parlamento do Mercosul

Yachan Pinsag

Em 2003, frente aos avanços do Mercosul e à sua reformulação institucional, a Comissão Parlamentar Conjunta (CPC) foi substituída pelo Parlamento do Mercosul (Parlasul). Esse processo teve início quando a antiga Comissão, em parceria com o Conselho Mercado Comum, definiu um Acordo Interinstitucional para harmonizar e agilizar as matérias que requeressem aprovação dos Congressos Nacionais dos Estados Partes.

As negociações sobre este novo órgão somente foram concluídas em 2007. De modo geral, as grandes mudanças propostas pelo Parlasul em relação à CPC são: as eleições diretas; o fim do consenso para a tomada de decisão; a distribuição proporcional do número de cadeiras; e a possibilidade de formação de grupos políticos. Essas características dão ao Parlamento mercosulino maior dinamicidade, capacidade de inovação e poder do bloco como representantes de interesses transnacionais (MEDEIROS et al., 2010).

Na prática, contudo, essas proposições ainda não atingiram sua total implementação. Somente o Paraguai e a Argentina aderiram às eleições diretas para seleção dos seus membros do Parlasul, enquanto os outros membros se encontram estancados no processo de consolidação da representação cidadã, ou seja, a escolha de seus parlamentares é realizada pela indicação entre os próprios líderes dos parlamentos domésticos – que devem buscar “uma adequada representação por gênero, etnias e regiões conforme as realidades de cada Estado”, de acordo com o Art. 6 do Protocolo Constitutivo do Parlasul – para um mandato, fixado, no Art. 10, de quatro anos com possibilidade de reeleição.

Grande parte do debate em torno da presença de mulheres no Parlamento evoca o princípio da representatividade. A ideia é que a pouquíssima presença feminina nesse espaço viola o princípio da democracia representativa, assim, como as mulheres constituem um grupo que é afetado pelas decisões políticas, devem poder participar e intervir nos processos que as definem e ver neles refletidos os seus interesses.

Mesmo após décadas da onda de disseminação do sufrágio feminino, elas ainda são sub-representadas nos parlamentos ao redor do mundo, compondo pouco mais de 20% dos parlamentos eleitos (SPOHR, MAGLIA, MACHADO, & OLIVEIRA, 2016).


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A 4ª Conferência das Nações Unidas sobre Mulher, realizada em Beijing, em 1995, foi um marco na agenda por representação feminina, tendo como consequência uma extensiva aplicação de políticas de cotas de gênero. Apesar de a América Latina apresentar uma tendência de linearidade progressiva quanto à presença de mulheres no legislativo, os resultados específicos e os contextos institucionais são bastante díspares.

Com uma média de representatividade parlamentar feminina de 26,6%, a região da América Latina fica em segundo lugar no mundo neste quesito, logo abaixo do grupo dos países nórdicos, que aparecem com uma média de 41,5%, liderando a classificação global de parlamentares mulheres, segundo relatório da União Interparlamentar. Os dados indicam quanto as mulheres latino-americanas avançaram no poder e quanto ainda falta alcançar quando o debate é sobre equidade.

Os dados classificados pelo Instituto Internacional para la Democracia y Asistencia Electoral (IDEA), liderada pela pesquisadora Pilar Tello, refletem o caminho que se produziu no continente desde a introdução das primeiras leis de cotas, que a Argentina inaugurou durante a década de noventa, quando as mulheres representavam só 8% de todos os parlamentares do país.

Mesmo diante de uma evolução no cenário político, com maior participação e representação das mulheres, a seara política ainda é um espaço que necessita muito avanço na questão, como podemos perceber pelos números abaixo.

Tabela 1: Frequência de gênero por parlamentos nacionais 

Fonte: IDEA (2016).

Observando os números da representatividade feminina dentro dos espaços legislativos nacionais dos Estados-membros da integração regional, já percebemos a superioridade dos números masculinos. Não correspondendo aos padrões da população, a participação de mulheres ainda é tímida e se mantém distante dos números dos desenhos demográficos dos países parte (População feminina: Argentina – 51,1%; Brasil – 50,8%; Paraguay – 49,6%; Uruguay – 51,7%; Venezuela – 49,8%). Destaque ao caso argentino, que graças ao sistema eleitoral interno de cotas de gênero alcança um índice muito superior aos outros países.

Agora seguindo a análise para o nível supranacional, observaremos os dados de gênero do Parlasul catalogados a partir de fontes oficiais do Mercosul e de cada Estado parte. Os números são correspondentes ao total de mandatos que cada país já teve no ambiente legislativo da integração regional.

Gráfico 1: Frequência de gênero por país membro

Fonte: autor (2019).

Os números demonstram um comportamento muito similar ao cenário interno de cada respectivo país, prosseguindo com o largo afastamento dos desenhos demográficos de seus países a figura feminina tem seu ponto mais baixo dentro dos mandatos do Brasil. Em todos os casos, se vê necessário tanto nos ambientes nacionais quanto nos supranacionais, a adoção de medidas que reflitam os preceitos constituintes do órgão para representatividade e legitimidade das instituições legislativas. Na medida em que a representação é ampliada, a legitimação das instituições encontra maior suporte e credibilidade. Assim, a incorporação da representação cidadã redireciona o Mercosul para uma maior legitimidade e representatividade. A inclusão de mais parlamentares mulheres no Parlasul pode ser essencial para o aprofundamento da integração.

Referências:

MEDEIROS, M. A. et al. A questão da representação no Mercosul: os casos do Parlasul e do FCCR. Revista de Sociologia e Política, v. 18, n. 37, p. 31-57, 2010.

SPOHR, Alexandre Piffero; MAGLIA, Cristiana; MACHADO, Gabriel  and  OLIVEIRA, Joana Oliveira de. Participação Política de Mulheres na América Latina: o impacto de cotas e de lista fechada. Rev. Estud. Fem. [online]. 2016, vol. 24, n .2, 2016.