Por: Miguel Quessada
Martins (2006) define branding como o conjunto de ações ligadas à administração das marcas que as levam para além da natureza econômica, passando a fazer parte da cultura e influenciar a vida das pessoas. São ações que têm a capacidade de simplificar e enriquecer a vida das pessoas em um mundo confuso e complexo. O termo é de origem inglesa e está relacionado aos projetos de criação ou gestão de marcas. Já o rebranding ou redesign de marcas é uma estratégia do marketing que tem a finalidade de aumentar a longevidade e a percepção de valor da marca. Há ainda a substituição quando ocorre processo de fusão ou aquisição de uma marca. Em casos assim, pode haver combinação dos nomes, deixar o nome mais conhecido ou ainda criar uma nova identidade totalmente diferente. (ALMEIDA, 2005)
No mundo corporativo, a Odebrecht anunciou o rebranding de sua holding após mudar o nome de todas as empresas do grupo (Odebrecht Construtora para OEC, Odebrecht Agroindustrial para Atvos, Odebrecth Óleo e Gás para Ocyan, Odecrecht Realizações Imobiliárias para OR e Odebrecht para OTP). Embora não seja um partido político, foi graças à corrupção envolta com os agentes políticos que conferiu a ela uma reputação negativa, já que foi a responsável pela maior delação premiada do país[1]. Sem referência explícita ao passado, a empresa adotou o nome de NOVANOR cuja inspiração é o futuro.[2]
Os partidos brasileiros sempre estiveram envoltos em críticas desde a formação e consolidação ainda na década de 1980. As críticas estão relacionadas à fragilidade das legendas, à baixa inserção social, à dificuldade da institucionalização dos partidos e apontamentos sobre o afastamento dos partidos da sociedade. Tais fatos corroboram para uma visão mais pessimista em relação aos partidos, de modo que os eleitores desconhecem as lideranças políticas, nutrem aversão às legendas e não se identifiquem com os partidos. (MAYER, 2018; BRAGA, PIMENTEL 2018). A falta de identificação partidária reflete na baixa participação do processo eleitoral, o que é preocupante nesse mercado já que o eleitor se nega a escolher um partido. Essa baixa participação já foi objeto de análise de Dalton, McAllister e Wattenberg (2003) que veem novas formas de ação política em que as eleições dão lugar às petições, protestos e manifestações. E longe de resistirem, os partidos têm procurado adaptarem-se às novas tendências. Braga, Rocha e Carlomagno (2015) já apontavam a presença dos partidos na Internet como forma de aproximação e mobilização política, ainda que alguns não utilizassem de forma assertiva as plataformas. Braga e Roeder (2017) sinalizam que apesar do papel central nas eleições dos partidos em recrutarem e selecionarem candidatos, o número de filiados tem decrescido ao passo que outros grupos reivindicam a representação política.
Devido à fragmentação partidária e a um conjunto complexo de regras eleitorais, há uma dificuldade do eleitorado em vincular os personagens políticos aos seus partidos, visto que o “baixo índice de identificação partidária é uma consequência de uma situação de informação limitada sobre os partidos (..) que combina baixo nível educacional e alta complexidade eleitoral” conforme demonstrado por Kinzo (2005). Tais fatores dificultam a criação de uma identidade partidária. Com o multipartidarismo em vigor, há mais de três dezenas de agremiações partidárias registrados no TSE 33 partidos e dezenas na fila de espera. A alta fragmentação partidária dificulta a assimilação por parte dos eleitores, já que são 33 “marcas” diferentes disputando o mesmo mercado e tentando dialogar com um cliente cada vez mais avesso em comprar esse produto.
A seguir serão apresentados os nove partidos que passaram por rebranding: MDB, PL, DC, Podemos, PATRIOTAS, Avante, Progressistas, Cidadania e Republicanos. União Brasil e Agir e uma análise comunicacional de suas logos.
Os partidos que optaram pelo rebranding suavizaram as cores dos logos e transmitiram um caráter mais jovial. Quando comparadas às anteriores, as atuais diminuíram o uso das cores e enfatizaram mais o novo nome da agremiação. O PPS, por exemplo, além de abandonar as corres mais saturadas e que remetem ao socialismo, optou por letras minúsculas. As cores menos saturadas e mais suaves nos novos logos ajudam a trazer a sensação de neutralidade e sutileza, além de uso de tipografia sem serifa e traço light, passando a impressão de clareza e simplicidade. Se fizermos uma analogia com a fala é como se antes houvesse gritaria e agora há uma fala calma, com autocontrole e mais centrada (LAVAREDA; CASTRO, 2016). Esse visual bem menos agressivo também foi utilizado pelo Progressistas, Podemos, Republicanos e Democracia Cristã. Já o MDB apenas retirou o P da sigla e optou por manter a marca que o fez conhecido no tempo do bipartidarismo em que rivalizava com a ARENA. Por sua vez, o PATRIOTA – um exemplo clássico, embora novo de partido catch-all – reforçou o tom nacionalista ao usar o verde e deixar o slogan “Brasil Acima de Todos”. De certa forma, ele aproveitou a popularidade do presidente Jair Bolsonaro que usou como mote: “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos” e unificou as frases, além de fazer referência ao patriotismo colocando a bandeira nacional na letra “O” do logo partidário. Em sua apresentação, faz um alinhamento discursivo semelhante ao presidente ao caracterizar o partido como “moralmente conservador, economicamente defensor do livre mercado e confessionalmente cristão”. Embora preterido pelo presidente, é nítido que todo o reposicionamento do partido – que defendia a bandeira ecológica – foi de alinhamento ao mandatário da República. Somente o PL retornou à logo original, trocando o R por L e a palavra República por Liberal, aproveitando a boa receptividade do termo junto à sociedade, ficando com o logo “engessado” quando comparado às mudanças realizadas pelas demais agremiações partidárias, além de ser o único que manteve o vocábulo partido após o reposicionamento. O PL (Partido Liberal) aproxima-se de modo sonoro do PSL (Partido Social Liberal), o que pode ter sido uma tática para atrair eleitores mais conservadores e alinhados à direita. Posteriormente, houve a filiação do presidente Jair Bolsonaro ao partido.
Percebe-se a predominância da cor azul nos novos logos, que é a cor mais utilizada em logos das marcas mais valiosas do mundo, além de, pela neuropropaganda, a cor azul ser associada a planejamento de comportamentos e pensamentos complexos, expressão da personalidade, tomadas de decisões e modulação de comportamento social (LAVAREDA; CASTRO, 2016).
Outro ponto importante é que todos os partidos dos nove que fizeram rebranding, nenhum está alinhado à esquerda. Pelo contrário, o novo posicionamento enfatizou por meio das cores e discurso que eles estão mais ligados ao centro e à direita brasileira. A fim de identificar os partidos de esquerda e direita foi utilizada a definição apresentada por Bolognesi, Ribeiro e Codato (2022) que utilizaram um survey com a comunidade de cientistas políticos brasileiros para definir a posicionamento das agremiações partidárias. Também foi possível observar que alguns partidos tiveram receio de estarem associados à esquerda e retiraram palavras relacionadas ao social ou ao trabalho. Logo, termos como trabalhista, socialista, social e ecológico foram banidos dos novos nomes com o objetivo de não serem associados a partidos de esquerda. Isso acontece pela falsa percepção das pessoas que podem ligar uma simples palavra à ideologia partidária. Dessa forma, é nítido que no Brasil quem faz o rebranding é a direita.
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Referências:
ALMEIDA, D. Rebranding:um guia sobre redesing de identidades visuais. DIACM: São Paulo,2014
BARQUERO, M.; CASTRO, H. C.; RANINCHESKI, S. Desconfiança nas instituições e partidos políticos na constituição de uma democracia inercial no Brasil: o caso das eleições de 2014. Política e Sociedade. V.15 nº32, 2016. Disponível em: <https://cutt.ly/vhJ3MMZ > Acesso em 17 jun 2022
BOLOGNESI, Bruno; RIBEIRO, Ednaldo; CODATO, Adriano. Uma Nova Classificação Ideológica dos Partidos Políticos Brasileiros. DADOS, Rio de Janeiro, vol.66 (2): e20210164, 2023
BRAGA, M DO S. S.; PIMENTEL JR., J. Os partidos políticos brasileiros realmente não importam? Opinião Pública, Campinas, v 17, n. 2, p. 271 -303. Disponível em:< https://www.scielo.br/pdf/op/v17n2/a01v17n2.pdf> Acesso em 15 jun. 2022
BRAGA, S.; ROEDER, K. M. Partidos Políticos e Sistemas Partidários. Intersaberes, Curitiba: 2017.
KINZO, M. D’A. Os partidos no eleitorado: percepções públicas e laços partidários no Brasil. RBCS Vol. 20 nº. 57 fevereiro/2005 Disponível em< https://www.scielo.br/pdf/rbcsoc/v20n57/a05v2057.pdf> Acesso em 10 jun. 2022
LAVAREDA, Antonio; CASTRO, João Paulo. Neuropropaganda de A a Z: o que um publicitário não pode desconhecer. Rio de Janeiro: Record, 2016.
MARTINS, J. R. Branding: um manual para você criar, avaliar e gerenciar marcas. Global Brands: São Paulo, 2006.
MEYER, R. Partidos Políticos no Brasil do Império à Nova República. Intersaberes:Curitiba, 2018.RIBEIRO, R. L. M.. Decadência longe do poder: refundação e crise do PFL. Revista de Sociologia e Política. v. 22, n. 49, p. 5-37, mar. 2014. Disponível em: < https://www.scielo.br/pdf/rsocp/v22n49/02.pdf>
[1] Disponível em: < https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2020/12/grupo-odebrecht-muda-o-nome-para-novonor.shtml> Acesso em 21 de dez de 2020.
[2] Disponível em: < https://www.novonor.com.br/>. Acesso em 21 de dez 2020.
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