As práticas de campanha on-line têm conquistado espaço na literatura brasileira de Ciência Política e também de Comunicação – muito disso é fruto do processo de digitalização intensificado desde a eleição de 2020, realizada em condições adversas e únicas (RUEDIGER e GRASSI, 2020). No entanto, a literatura também mostra que a modernização e consequente digitalização das campanhas brasileiras trata-se de um processo contínuo e crescente (CARLOMAGNO e BRAGA, 2018).

E como medir a digitalização das campanhas? A literatura mostra que existem caminhos diversos para executar tal tarefa, aqui aposto em dois: a presença ou ausência dos candidatos(as) nas redes sociais on-line (RSO) e nos ambientes digitais, além do gasto de campanha declarado pelos mesmos(as) em gastos que podem ser, comprovadamente, tipificados como de campanha on-line. 
Com isso, neste post uso dados da minha tese de doutoramento para discutir o uso de mecanismos on-line de campanha tomando como variável principal a região do país (Norte, Nordeste, Sul, Sudeste e Centro-Oeste). A proposta é testar duas hipóteses: (1) há diferenças significativas na presença digital dos candidatos(as) a depender da região em que eles disputam o pleito? E (2) havendo divergência, ela transborda para os gastos de campanha?

Desta forma, cabe explicar (rapidamente) os métodos da pesquisa, tanto de formulação do corpus de candidatos(as), como a tipificação dos gastos de campanha e sua relação com o conceito de campanha hipermidiática (HOWARD, 2006). A pesquisa trata de todos(as) os(as) candidatos(as) relevantes que disputaram o cargo de prefeito(a) das capitais brasileiras em 2020 – como critério ad hoc, considerou-se relevante o(a) candidato(a) dono de, pelo menos, 5% dos votos válidos no pleito. Com isso, chega-se a um corpus composto por 120 candidatos(as), antes eram 304.

Em seguida, cabe detalhar a divisão de gastos de campanha declarados a partir de estudos dispostos na literatura. A partir da divisão feita por Speck e Mancuso (2017), busquei adaptar a divisão que a dupla faz dos gastos em relação a tipos clássicos de campanha eleitoral. Desta forma, considero aqui como gastos típicos de campanha hipermidiática apenas dois tipos de despesa: o gasto com impulsionamento de conteúdo e a criação de site na internet. 

Dito isso, vamos à análise. O primeiro dado exposto diz respeito à presença ou ausência dos candidatos(as) em seis ambientes digitais: Facebook, Twitter, Tiktok, Instagram, Youtube e Site. A variável aqui é binária (sim / não) e pretende identificar apenas quais candidatos(as) fizeram uso destas plataformas durante o período de campanha – a busca exploratória foi feita ainda durante a campanha de 2020 e confirmada no mesmo período. 

O gráfico 1 revela que o duopólio composto pela Meta, empresa dona do Facebook e Instagram, se fez presente em 100% das candidaturas relevantes de todas as regiões brasileiras em 2020. As diferenças começam nas demais redes: o Twitter, conhecido por reunir a elite política e midiática, foi muito utilizada pelos(as) prefeituráveis relevantes, especialmente na região Sul (100%).

Ainda observando o uso destes ambientes digitais em diferentes regiões, nota-se que o Youtube, importante repositório de vídeo, foi especialmente relevante no Sul, Centro-Oeste e no Sudeste, tornando-se menos presente em regiões como Norte e Nordeste. O site, ferramenta que inaugurou as campanhas on-line no Brasil (BRAGA e CARLOMAGNO, 2018) também se fez mais presente nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, enquanto os menores índices desta plataforma foram encontrados no Nordeste (52,63%) e no Norte (72,50%).

Por fim, tratando especificamente do Tiktok, tido por alguns a rede “novidade” da eleição de 2020 (RODRIGUES, 2022), é visível que tal plataforma se fez mais presente no Sudeste (47,36% dos candidatos relevantes tinham perfil ativo na rede) e no Sul (45,45%), mostrando-se menos presente na disputa do Centro-Oeste (27,27%), Nordeste (12,50%) e Norte (12,50%).

Gráfico 1
Regiões e uso de plataformas

Campanha Digital 2022
Fonte: o autor (2022)

Observando especificamente as regiões, entre si, nota-se que entre as regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste não existem divergências relevantes, exceto no uso do Tiktok. Enquanto entre os candidatos(as) relevantes o uso de plataformas digitais se fez menos frequente e intenso entre aqueles(as) que disputaram o cargo de prefeito das capitais do Norte e do Nordeste – tal diferença será “tensionada” em seguida, quando observo os gastos de campanha. 

O próximo passo é olhar para a “fatura” da campanha eleitoral de forma “agrupada”. Para tanto, os gastos de campanha foram agrupados em tipologias: organização, campanha tradicional, campanha moderna, outros e campanha hipermidiática – este último reúne os dois gastos típicos de campanhas digitais. O gráfico 2 exibe a distribuição percentual destes gastos nas cinco regiões brasileiras.

Gráfico 2
Gasto de campanha por região brasileira

Fonte: o autor (2022)

O gráfico 2 revela que, apesar da presença digital dos candidatos da região Nordeste não ser o maior entre as cinco regiões, foi já que o gasto em campanha hipermidiática se fez mais relevante (6,64% do total declarado pelos prefeituráveis), sendo seguida da região Sudeste (4,82%). Enquanto isso, regiões com grande presença dos prefeituráveis no ambiente digital, como o Sul, tem gastos mínimos no ambiente digital (no caso do Sul, o gasto com campanha hipermidiática é de 1,15% do total declarado).

Respondendo a primeira pergunta que move o post (existem diferenças na presença digital?) a resposta é sim: há diferenças na forma como os prefeituráveis, a depender da região do país, usam os ambientes digitais. Mas, ao observar a segunda questão (isso transborda para os gastos de campanha?) e a resposta é não – observando os gastos de campanha, houve mais investimento nas atividades tipicamente digitais no Nordeste e não no Sul e Sudeste, regiões com maiores investimentos em campanhas digitais. 

Cabe destacar que este post utiliza dados apenas da presença digital dos candidatos(as) nas plataformas referidas e dos gastos de campanha, sem tratar especificamente do conteúdo publicado nestes ambientes. Além disso, a divisão dos gastos de campanha é feita a partir da tipologia fornecida pelo próprio Tribunal Superior Eleitoral (TSE), deixando de fora dos gastos digitais categorias amplas, como a “prestação de serviços”, tipologia amplamente utilizada de forma genérica pelos prefeituráveis em 2020.

Referências: 

​​BRAGA, Sérgio; CARLOMAGNO, Márcio. Eleições como de costume? Uma análise longitudinal das mudanças provocadas nas campanhas eleitorais brasileiras pelas tecnologias digitais (1998-2016). Revista Brasileira de Ciência Política, p. 07-62, 2018. 

RODRIGUES, Luisa Farias. Eleições check: o TikTok como dispositivo de aproximação entre políticos e jovens eleitores na eleição municipal de São Paulo-SP em 2020. 2022.

HOWARD, P. N. et al. New media campaigns and the managed citizen. Cambridge University Press, 2006.

SPECK, Bruno Wilhelm; MANCUSO, Wagner Pralon. Street fighters” e “media stars”: Estratégias de campanha e sua eficácia nas eleições brasileiras de 2014. Cadernos Adenauer, v. 3, n. 7, p. 121-138, 2017.

RUEDIGER, Marco Aurélio; GRASSI, Amaro. O ecossistema digital nas eleições municipais de 2020 no Brasil: o buzz da desconfiança no sistema eleitoral no Facebook, YouTube e Twitter. 2020.