Por: Paula Oliveira

A utilização de ferramentas digitais pelas instituições parlamentares não é novidade no cenário brasileiro e tampouco no cenário internacional. Os estudos mostram parlamentos cada vez mais inseridos no ambiente digital em diversos países (GIRALDO-LUQUE; VILLEGAS-SIMÓN; BUGS, 2017; LESTON-BANDEIRA, 2018).

Apesar de haver variações, especialmente no que diz respeito ao âmbito de cada legislativo – nacional, estadual e municipal – as pesquisas mostram que até mesmo em nível local, têm sido implementadas práticas de uso da comunicação (MITOZO et al, 2021), o que tem relação não apenas com a necessidade de atender os representantes e cidadãos, mas de melhorar a imagem de tais instituições.

E essa popularização das últimas duas décadas se intensificou com a pandemia de COVID-19, a partir de 2020, devido às medidas de isolamento adotadas como contenção de contágio pelo vírus (MITOZO, 2020). No Brasil, o Congresso Nacional foi um exemplo de uso do digital para o trabalho parlamentar remoto (BRAGA; WISSE, 2021). No entanto essa rapidez parece não ter ocorrido na mesma intensidade em outros âmbitos.

Deste modo, trazemos um recorte referente aos legislativos locais, no sentido de compreender como estes parlamentos têm se inserido e alterado a forma como articulam as práticas de comunicação diante do contexto da pandemia, com foco as páginas do Facebook, rede social de maior utilização no Brasil (Digital News Report, 2021). A observação leva em conta 60 dias de uso da rede em 2019 (outubro e novembro) e mais 60 dias em 2022 (junho e julho).

Foram categorizados 264 postagens em 2019 e 306 em 2022. A análise foi dividida em dois momentos: (1) apresenta-se a inserção dos 399 parlamentos do Estado no ambiente digital, tendo como indicador a presença no Facebook antes e “depois” da crise sanitária (2019 e 2022); (2) e, em seguida, compara-se as características dos conteúdos publicados nos períodos a partir de cinco Câmaras – Curitiba, Matinhos, Pato Branco, Guarapuava e Palotina – considerando contemplar as sub-regiões do estado e diferentes tamanhos.

Sobre a inserção dos parlamentos na rede, Oliveira (2019), em mapeamento realizado no Paraná, mostra que, dos 399 municípios, 130 possuíam perfis ativos no Facebook em 2019, o que equivale a um terço das casas legislativas no estado (32%). O cenário da pandemia, no entanto, alterou um pouco a estatística: no final de 2020, 178 municípios tinham perfil na rede, alcançando 44% do total. Já em 2022, nota-se que 251 municípios atuam efetivamente em suas fanpages. O resultado inicial indica um aumento da apropriação do meio entre 2019 e 2022.

Intensificação de conteúdos

A respeito das formas de uso, sobre a intensidade de publicações, os dados abaixo apontam uma distinção sobre o legislativo municipal mais ativo em cada período. Isto porque em 2019, a frequência em que Pato Branco utilizou o Facebook se sobressaiu frente às outras Casas. Enquanto em 2019 foram 92 posts (34,7% do total), em 2022 a frequência caiu para 68 (22,2%). Curitiba foi a segunda colocada, mesmo considerando que a frequência de um ano para o outro obteve acréscimo, com 41 publicações a mais em 2022. Por outro lado, a capital do Paraná apresentou baixa no comparativo, caindo para 65 publicações totais na nova observação. Aqui, pode-se levar em conta as restrições adotadas pelo parlamento durante o período em eleitoral. Deste modo, em 2022, Palotina – em terceiro no levantamento anterior – toma a frente com 37,3% do quantitativo total avaliado (306 publicações).

Gráfico 1
Percentual de publicações entre 2019 e 2022

Fonte: Autora 2022

Já as Câmaras de Matinhos e de Guarapuava vão ao encontro do conceito colocado por Margetts (2011), ressaltando a necessidade de tornar a instituição mais transparente e vigiada pelos cidadãos, que ocorre sobretudo por meio do provimento de informação que passa pela criação de conteúdo. Guarapuava passou 3,0% publicações em 2019 para 8,8% em 2022. Do mesmo modo o legislativo de Matinhos subiu de 6,8% de publicações em 2019 para 10,5% em 2022. 

Percentual de uso de formatos entre 2019 e 2022

Analisa-se também a forma das publicações a partir de categorias criadas para observar quais tipos de posts foram feitos pelos parlamentos. Conforme os dados, devido à relevância do formato – que possibilita ao munícipe acompanhar os principais debates em tempo real – a frequência para este tipo de publicação se sobressaiu em 2019. Isto porque, mesmo antes da pandemia, muitos dos legislativos se utilizavam prioritariamente do formato.

Gráfico 2
Percentual de uso de formatos entre 2019 e 2022

Fonte: Autora 2022

O que encontramos em 2022, mesmo com a manutenção das lives de sessão (22,6% para 21,6%), foi o alto investimento em outros modos de divulgação, como vídeos produzidos por equipes especializadas (de 8,3% para 21,9%) e na publicação de links, que subiu de 9,1% em 2019 para 23,5% em 2022. Este último formato, no caso de Palotina, levava para o site da Câmara, enquanto Matinhos utilizou links para atrair o público a acompanhar sessões e audiências públicas no Youtube.

Os dados ainda apontam uma alta considerável nas lives em geral, quando a transmissão ao vivo é de um parlamentar comentando a sessão ou uma homenagem, por exemplo. Entre os legislativos analisados, a Câmara de Curitiba foi a que mais adotou transmitir audiências públicas ao vivo em 2022. Isto pode indicar um incentivo do parlamento para manter a participação popular durante as reuniões, mesmo com as medidas de restrição.

Agenda institucional x foco no vereador

Muitas Câmaras confundem o trabalho institucional, empenhando suas estratégias basicamente na imagem do vereador, ainda que este seja parte das instituições. Em teoria, portanto, a visibilidade que deveria ser sobre a Câmara, prioriza o agente, algo que pode ser observado, em 2022. Aqui, observamos como a imagem dos vereadores foi apresentada nas fanpages.

Em 2019, enquanto a imagem do agente político (68,4%) fica atrás da imagem do legislativo (71,3%), isso se inverte no pós-pandemia. No levantamento mais atual os vereadores aparecem em 258 publicações de 306, seja por meio de vídeos ou em imagens publicadas. E isso ocorre seja nas sessões ordinárias, apresentando indicações de serviço ou mesmo recebendo visitas no parlamento. 

Gráfico 3
Imagem dos vereadores x imagem da câmara e do cidadão

Fonte: Autora 2022

Mas esses dados merecem atenção especial. Miola e Marques (2017), numa tentativa de definir a comunicação pública destacam que, em uma instituição, há iniciativas que visam contribuir com práticas que aproximam os cidadãos das instituições, aumentando a transparência e a prestação de contas, enquanto de outro existe uma dimensão estratégica da comunicação institucional, que perpassa pelo uso de política de imagens personalizadas. O que se busca dizer, portanto, é que embora haja uma personalização da comunicação, ocorrendo por meio de um direcionamento da imagem do político, ela acontece por conta da divulgação dos atos oficiais.

Já na frequência de citação dos vereadores no texto, de nome autoexplicativo, o percentual de ausência é mais relevante. E, conforme os dados anteriores a respeito da imagem dos parlamentares, acontece especialmente em 2022. Em 2019 há maior ausência da citação dos agentes políticos nas publicações. Uma possibilidade é o fato de as Câmaras terem investido em diversas formas de apresentar seus trabalhos ao público nos dois anos de pandemia, expandindo das sessões ordinárias para outros mecanismos.

Gráfico 4
Presença de citação dos vereadores

Fonte: Autora, 2022

O legislativo de Palotina é um exemplo do uso das redes para além das sessões, pois aumentou o índice de publicações apostando em recortes em vídeo com a palavra dos parlamentares. Os materiais são extraídos das reuniões, sendo publicados no dia seguinte à sessão com o discurso feito por cada vereador sobre os temas corridos.

Guarapuava também divulga os acontecimentos da sessão, com foco em fotos e textos com a apresentação dos projetos e ações em geral dos agentes políticos. Mesmo Curitiba, que procura o respaldo institucional, ressalta os vereadores presidentes de audiências públicas ou reuniões de comissões.

Algumas considerações

Observa-se que, apesar das limitações dos parlamentos em nível local, é inegável que a comunicação institucional tende a ser cada vez mais valorizada, com aumento do uso entre os dois períodos.

Outros resultados são relevantes de destacar como o foco maior nos vereadores, o que evidencia a quase indissociável relação entre Câmara e eleitos no caso dos parlamentos locais. Também se notou outros formatos que mostram profissionalização, como uso de vídeos produzidos.

Por fim, a abordagem mostra uma transformação possivelmente irrevogável, no qual a esfera política passará, cada dia mais, a buscar espaço no ambiente online. E, nesse sentido, os parlamentos modernos estão colocados perante o dilema de ampliar a digitalização de suas atividades, acompanhando o desenvolvimento da sociedade da mesma forma.

Referências

BRAGA, Sérgio; WISSE, Fernando. Repertórios de ação dos parlamentos digitais brasileiros durante o enfrentamento da pandemia. E-legis, Brasília, Edição especial, p. 36-56, mar/2021.

GIRALDO-LUQUE, S.; VILLEGAS-SIMÓN, I.; BUGS, R. C. ¿Cómo usan los parlamentos las redes sociales? Un estudio comparado y longitudinal aplicado a países de América y Europa (2010, 2015 y 2017). Revista Latina de Comunicación Social, 72, 2017, pp. 1.278 a 1.299.

LESTON-BANDEIRA, Cristina. Parliament and Public Engagement. Exploring Parliament. 2018.

MIOLA, Edna; MARQUES, Francisco Paulo Jamil. Por uma definição de comunicação pública: tipologias e experiências brasileiras. In: Congresso da Associação Brasileira de Pesquisadores em Comunicação e Política (Compolítica), 7., 2017, Porto Alegre. Anais […] Porto Alegre: 2017.

MARGETTS, Helen. (2011). The internet and transparency. The Political Quarterly, v. 82, n. 4, p. 518-521.

MITOZO, Isabele. (2020). O uso de sistemas deliberativos remotos pelas Assembleias Legislativas Brasileiras durante a pandemia de Covid-19: características e perspectivas. Revista Legislativa Paranaense, Curitiba, p, 24-9.

MITOZO, Isabele; MASSUCHIN, Michele; OLIVEIRA, Paula. As ações digitais das Câmaras Municipais na pandemia de COVID-19: um estudo de caso de Belém, Curitiba, Goiânia, Salvador e São Paulo. In: Simpósio Interdisciplinar sobre o Sistema Político Brasileiro, 3., 2021, Rio de Janeiro. Anais eletrônicos… Rio de Janeiro: 2021. p. 269-288.

NEWMAN, N. et al. Reuters Institute:Digital News Report 2021. London: Reuters Institute; University of   Oxford, 2021.

OLIVEIRA, P. A. de. Legislativo em rede: uma proposta de análise empírica sobre apropriação das câmaras municipais paranaenses no Facebook. In: Workshop Comunicação e Comportamento Político, Mídia e Opinião Pública, 3., 2019, Curitiba. Anais eletrônicos… Curitiba: 2019. p. 57-68.