Como as mudanças na legislação de propaganda eleitoral brasileira e na estrutura da comunicação tradicional e digital impactam no Índice de Democratização?

Daniela Neves

Este texto apresenta um resumo da tese defendida pela autora em março deste ano e que discute a democracia eleitoral, analisando de que forma as mudanças na legislação de propaganda eleitoral brasileira e na estrutura da comunicação tradicional e digital impactam no Índice de Democratização. Este estudo foi aplicado nas eleições municipais.

A análise da democracia eleitoral é feita através do Índice de Democratização (ID), de Tatu Vanhanen, utilizando duas dimensões fundamentais: competição e participação. São analisadas as eleições municipais entre os anos entre 2008 e 2016, com dados agregados das eleições de primeiro turno em todos os 5.570 municípios, tendo como fonte o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O segundo turno não é considerado por ter apenas dois concorrentes e não ser possível verificar a força dos partidos menores, conforme modelo teórico utilizado.

Para a variável comunicação das campanhas, são utilizados dados de estrutura formal de comunicação eleitoral: tradicional, através do rádio e TV pela transmissão do Horário Gratuito de Propaganda Eleitoral (HGPE); e digital, que é o acesso aos sistemas multimídias em sistema de banda larga.

Vanhanen começou a medir democracia aplicando o Índice de Democratização em 114 países (1971), passando para 147 (1990) e depois para 172 (1997), sendo o último grande estudo sobre o tema aplicado em 170 países (2004). Por abranger tantos países, com sistemas e regras eleitorais diversas, Vanhanen analisou variáveis mais amplas, porém fundamentais e facilmente encontradas em todas as nações estudadas.

Neste trabalho, a metodologia será aplicada nas mesmas dimensões de Vanhanen – competição e participação –, porém em municípios que, apesar de obedecerem às mesmas regras eleitorais, têm estruturas de comunicação diversas.

Até 2006, a Anatel não tem dados por municípios. Da mesma forma, antes de 2000 a Anatel não tem relatório de SCM publicados porque apenas no início de 2000 o Brasil passou a ter acesso a banda larga de internet. Assim, serão analisadas as eleições municipais a partir de 2008.

Os indicadores foram calculados com as seguintes fórmulas:

Onde:

CompID – indicador de competição

Compar – comparecimento nas eleições

Vot_melhorcolocado – quantidade de votos recebida pelo candidato(a) que ficou em primeiro lugar, com dados do primeiro turno.

Considera-se o comparecimento o total de votos nominais, brancos, nulos, ou seja, o total de pessoas que votaram de alguma forma nas eleições majoritárias. A variável voto no melhor colocado considera o total de votos recebidos pelo candidato que recebeu o maior número de votos no primeiro turno, mesmo que a disputa siga para o segundo turno e independentemente do número de votos recebidos pelo segundo colocado. Para calcular o indicador de participação, foi usada a fórmula adaptada por Cervi (2017):

Onde:

PartID – indicador de participação

Eleitores_aptos – inscritos na Justiça Eleitoral que estão aptos a votar naquele ano

Com os dois indicadores, foram calculados os Índice de Democratização com a fórmula original de Vanhanen:

Tendo o ID, PartID e CompID, é possível calcular a regressão linear com as variáveis comunicacionais. A regressão linear permite identificar determinações, ou seja, quanto que, ao aumentar uma unidade na variável explicativa, é possível predizer de aumento na variável dependente (CERVI, 2019).


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De forma sumarizada, foram utilizados os seguintes dados para as variáveis independentes:

Quadro 1 – Dados utilizados para as variáveis independentes

Fonte: autora (2020).

Foram associados os IDs gerais com os dois tipos de comunicação: tradicional (C_TRADIC) e digital (C_DIGITAL) e depois os indicadores de participação e competição de forma separada. O resultado dos coeficientes foi o seguinte:

Tabela 1 – Resultados de coeficientes dos três anos estudados

Fonte: autora (2020).

Os asteriscos mostram testes que são estatisticamente significativos. O sinal negativo mostra posições contrárias, ou seja, aumentando uma variável, diminui outra. O positivo mostra variáveis na mesma posição.

Percebe-se que calcular apenas o índice geral não explica muito as diferenças de maior ou menor democracia eleitoral.  É preciso separar os indicadores de participação e concorrência para compreender a diferença entre os índices, de acordo com o acesso maior ou menor à estrutura de rádio, TV ou comunicação digital.

Nos modelos de regressão com resultado de significância estatística, o maior acesso à Comunicação Digital atrapalha o indicador de participação em 2008 (-11.68), 2012 (-98.97) e 2016 (-10.37). A Comunicação Tradicional também atrapalha a participação nos três anos estudados – sendo -2.34 em 2008, -35.74 em 2012 e -2.38 em 2016. Ou seja, quanto mais emissoras tem o município, menos participação na votação.

Quando são separadas as variáveis para testar competição, as duas variáveis comunicacionais ajudam a aumentar a competição em 2008 e 2016, mas não em 2012. No primeiro ano testado, a associação com a comunicação tradicional apresenta coeficiente positivo de 9.98, em 2016, 1,76. Já em 2012, o resultado não é significativo. Em 2012, a Comunicação Digital atrapalhou a Competição (-830.14). Já em 2008 (+9.98) e 2016 (+19.73), quanto mais acesso à comunicação digital, maior a competição entre os candidatos a prefeito. Desta forma, não há um resultado linear para os anos estudados, ou uma tendência de aumento ou diminuição dos indicadores durante este período analisado.

Assim, o resultado dos testes demonstra que a conjuntura de cada eleição gera indicadores diferentes. Por este motivo, não é possível afirmar que as mudanças na legislação eleitoral em 2015 no que se refere à propaganda dos candidatos provocou uma mudança significativa na participação, apesar de indicar que nos municípios onde os eleitores recebem mais informação, tanto tradicional como digital, de seus candidatos a prefeito, a tendência é de uma participação menor. Já para a competição, associada à comunicação digital, apresenta aumento em municípios com mais disponibilidade de acesso no município.

Referências

CERVI, E. U. Manual de Métodos Quantitativos para Iniciantes em Ciência Política – Volume II. Curitiba:CPOP, 2019

CERVI, E U. Eleições municipais e crise nacional: disputas eleitorais para prefeito e vereador no Brasil em 2016. Anais, 4º Congreso Latinoamericano y Caribeño de Ciencias Sociales. Salamanca. 17 al 19 de Julio de 2017.

VANHANEN, Tatu, Dependence of Power on Resources: A Comparative Study of 114 States in the 1960s. Department of Social Sciences Publications no. 11. Jyväskylä: University of Jyväskylä, 1971.

____________________The process of Democratization: A comparative study of 147 States – 1980-88. New York: Taylor & France New York Inc. 1990

________________Prospects of democracy: A study of 172 countries. London and New York: Routledge. (1997).

__________________Democratization: A Comparative Analysis of 170 Countries. London: Routledge, 2004.