O texto, produzido pelo pesquisador Felipe Paz, aborda o papel crucial do horário gratuito de propaganda eleitoral, destacando mudanças recentes que incentivaram candidatos negros, embora sua presença ainda seja minoritária. O debate racial é raro na propaganda, principalmente entre candidatos de esquerda negros, sugerindo que essa pauta pode não ser amplamente valorizada como estratégia eleitoral. Isso levanta questões sobre a representatividade real da discussão racial no congresso.
O horário gratuito de propaganda eleitoral é, desde sua criação ainda nos anos 1950, um objeto multifuncional para políticos individuais e partidos políticos, quanto a imagem dos candidatos é um espaço em que não só se fazem conhecidos, mas também reforçam sua existência e principais pautas para os eleitores, constroem sua identidade na busca de captar mais votos, sendo um método mais eficiente quanto mais dispersos geograficamente estão os eleitores. Para os partidos políticos é um espaço em que podem selecionar os candidatos mais interessantes a se eleger, assim como as pautas que querem evidenciar no cenário, ou que já tem saliência no cenário político do momento.
Quanto a nós cientistas políticos, temos no horário gratuito de propaganda eleitoral (HGPE) uma variável importante para avaliar uma série de coisas, mesmo não tendo papel preditivo do voto em candidatos, pode servir de instrumento para análise de conjuntura.
Recentemente tivemos a reinterpretação de dois ordenamentos jurídicos que, particularmente, alteram o processo de seleção dos candidatos a serem registrados pelos partidos, e estes são a lei de cotas para eleições(lei 9504/1977) em 2020, conjunto à lei que estabelece contagem dupla para votos depositados em pessoas não brancas e mulheres quanto para a contagem do fundo eleitoral (Emenda constitucional 111/2021), que incentiva os partidos a terem mais candidatos destes segmentos se apresentando para a eleição. Vide isso, poderíamos esperar que pautas minoritárias tivessem maior espaço na propaganda eleitoral.
Olhando para o discurso racial, seja como forma de construir empatia para com o candidato ou como conteúdo de políticas públicas, tivemos nessa eleição os seguintes achados: 17,3% dos candidatos se auto declaram pardos, 8,2% pretos, 1,6% indígena/amarelo, sendo que partidos à esquerda tem ainda mais candidatos negros, 12,7%. Para além disso, candidatos negros, proporcionalmente, tem mais tempo de tela, apesar de em menor quantidade agregada, sendo 9,1% do total de tempo de tela de todo o HGPE, esse número é distribuído de maneira desigual de acordo com gênero e espectro político, sendo que se o candidato é negro ele tem tempo maior de tela em partidos de esquerda, sendo que, destes as mulheres tem proporção ainda maior de tempo de programa eleitoral. Podemos visualizar os resultados abaixo:
Quando olhamos os dados podemos pensar que temos uma situação muito favorável às minorias raciais, pois seu tempo de tela é proporcionalmente maior, porém devemos lembrar que estes são apenas 8,2% dos candidatos, portanto apresentam tempo de tela muito inferior a candidatos brancos e mesmo pardos. Não somente isso, o número de mulheres negras que aparecem nos segmentos é ainda menor, e sua média é intensamente elevada por campanhas de peso como de Carol Dartora do Partido dos Trabalhadores. Outro fator importante a se ponderar é a existência de muito menos partidos de esquerda, portanto quando olhamos para a média dos partidos de direita, todas muito parecidas, levamos em conta ainda que são muitos mais programas que partidos de esquerda, sendo que vários destes são apenas segmentos com o banner do candidato, isso é, aparece apenas sua imagem e número, porém sem falas e com tempo de tela igual e muito curto para todos.
Mais do que isso, quando olhando para a mobilização de temas que envolvam etnicidade ou radicalidade, temos um número muito incipiente de citações. Mesmo quando agregamos a quantidade de menções discursivas sobre o tema e categorias mais simbólicas, como vestuário ou demais elementos da propaganda, encontramos que apenas 1,92% dos segmentos totais (39 dos 2026 segmentos verificados) tratam destas questões, proporção consideravelmente menor que a de candidatos e tempo de tela que aparecem concentrados em indivíduos não brancos.
O que encontramos é que, mesmo havendo candidatos competitivos que sejam negros ou pardos, a pauta racial parece ou não ser atrativa ou não fazer parte da identidade daqueles selecionados para a propaganda, o que pode servir para uma visão da conjuntura política paranaense em que estes temas ainda são minoritários no debate. Quando olhamos para quem mencionou o debate racial de maneira direta, temos apenas a candidata já mencionada Carol Dartora (PT) e o candidato Bruno Camargo (PDT), sendo que a primeira já defende o debate racial em diversas outras esferas, sendo uma de suas principais bandeiras de campanha, e sendo eleita primeira deputada federal negra do Paraná, enquanto o segundo acabou por não se eleger. Isso demonstra que o debate não é um critério necessariamente danoso para os candidatos, porém quando vemos que ambos são candidatos de esquerda e negros, vemos que a pauta ainda é muito restrita a certos grupos, podendo ser algo ainda pouco valorizado como forma de ganhar amplamente votos. Seria interessante, em análises futuras, um exame de se esses candidatos mobilizam pautas acerca de uma igualdade social mais ampla, de modo que possam tangenciar o tema racial, mas sem mencioná-lo diretamente, ou se os candidatos escolhidos para o pleito se distanciam deste, se configurando numa representação meramente cosmética da pauta racial dentro do congresso.
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