Nayane Cardoso analisa o uso das redes sociais pelo Ministério das Relações Exteriores em governos distintos (Dilma Rousseff, Michel Temer e Jair Bolsonaro). A análise mostra que, apesar da diplomacia ser o tema predominante, posts sobre comunicação pública de Estado têm maior engajamento. Isso indica uma mudança na interação dos usuários com o conteúdo postado pelo Ministério no Facebook ao longo dos governos.

Como vimos no artigo anterior sobre o Ministério das Relações Exteriores, a utilização de redes sociais por organizações públicas já é um fato. Essa necessidade nasceu da percepção dos órgãos públicos de que era preciso uma comunicação mais direta, digital e de fácil acesso, uma adaptação às configurações sociais do século XXI. Entretanto, como um ministério extremamente institucionalizado utiliza essa página na rede social Facebook? A variável governo altera o conteúdo? E qual é a média de engajamento das perspectivas de comunicação pública, democracia digital e diplomacia digital? Essas são alguns dos questionamentos que exploraremos nesse artigo com a ajuda dos dados primários da dissertação.

A figura 1 demonstra as palavras que mais se repetem nas postagens do ministério na amostra longitudinal dos governos de Dilma Rousseff, de Michel Temer e de Jair Bolsonaro. Então, podemos observar que nos três governos os temas como informações sobre a política exterior brasileira e internacional, o Mercosul, a Europa, o comércio e a economia são predominantes. As figuras 2, 3 e 4 demostram quais são as diferenças e semelhanças temáticas entre os governos.

Figura 2-Nuvem de imagem Dilma_Gov. Fonte: Autora.

No governo de Dilma Rousseff a organização ministerial utilizou mais variação de temas que os demais governos. É importante ressaltar que o conteúdo também apresenta mais requisitos da variável diplomacia digital e há uma recorrente menção a esfera política/governamental com a repetição do termo “Presidenta”. A figura 3 do governo Michel Temer exibe diferenças na preferência em questões democráticas e na figura política do ministro da época, Aloysio Nunes. Essa preferência para o reforço do tema democrático também é observada na Controladoria-Geral da União no período de Michel Temer, como apontado pela pesquisadora Andressa Kniess e pelo pesquisador Jamil Marques (2021), no qual ainda reforçam que essa poderia ser uma estratégia para reforçar a legitimidade governamental depois do impeachment da Presidenta Dilma Rousseff.

Figura 3-Nuvem de imagem Temer_Gov. Fonte: Autora.
Já no governo de Jair Bolsonaro podemos identificar a economia e as relações comerciais entre o Brasil, o Mercosul e a Europa como temática exclusiva desse período, como datado na figura 4. Mas depois de passar pelas figuras 2,3 e 4 é necessário salientar a existência de algumas similaridades entre esses governos. A primeira é a recorrência do Mercosul e a preocupação na manutenção -manter, conversar e estabelecer- desse acordo comercial; por conseguinte, a questão econômica do Brasil. O último ponto é o uso personalista do perfil institucional com a menções de autoridades políticas e governamentais – presidente e ministro. Esse é um resultado de outras pesquisas como a realizada por Vivian Peron, 2017, no perfil do Twitter do ministério (PERON, 2017). Os resultados das figuras são reforçados quando analisamos o gráfico 1.

Figura 4-Nuvem de imagem Bolsonaro_Gov. Fonte: Autora.

O gráfico 1 está dividido em quatro quadrantes e dependendo da posição das variáveis nos quadrantes os resultados são alterados. Logo, podemos observar que os três governos possuem conteúdos diferentes, uma vez que cada ocupa um quadrante. Os períodos governamentais de Dilma Rousseff e Michel Temer são os mais antagônicos, relembrando que um prioriza a diplomacia digital e o outro a democracia digital. O ministério no período de Jair Bolsonaro está mais central, ou seja, possui temática recorrente quando comparado com os outros dois – a questão econômica.

Gráfico 1- Dimensões dos 3 Gov. Fonte: Autora.

Antes de analisarmos a tabela 1 é importante relembrar a proposta da pesquisa. A primeira parte do objetivo geral da dissertação é realizar uma pesquisa comparativa verificando mudanças, proximidades e diferenças na atuação ministerial feita nos governos Dilma Rousseff, Michel Temer e Jair Bolsonaro. Já a segunda parte é uma perspectiva quali-quanti das perspectivas da comunicação pública, democracia digital e diplomacia digital. Os critérios de análise de presença ou ausência nos posts parte do post ter algum dessas palavras em seu corpo textual. A (1) comunicação pública de Estado com as considerações sobre transparência e accountability, participação, prestação de serviços (MIOLA & MARQUES, 2017). Já a (2) democracia digital demonstra uso do espaço para questões democráticas brasileiras, seja no internacional ou nacional (ALMADA et al, 2014). E por causa do caráter especial do ministério, a (3) diplomacia digital contribui entendendo as atividades diplomáticas e o uso do termo diplomático (PERON, 2017).

DemocraciaDiplomaciaComunicação pública
Posts139750
Média311,6803119308,6978799316,3336585
Engajamento319784349446324242

Tabela 1-Variáveis x Engajamento valor Média. Fonte: Autora.

A tabela 1 examina a média do engajamento – soma de todas as interações dos usuários com um post – em relação as variáveis Democracia, Diplomacia e Comunicação pública. O total de posts é de 160, sendo que 13 são de Democracia, 97 de Diplomacia e 50 de Comunicação pública. Ou seja, o conteúdo predominante é o diplomático. Mas o interessante dessa tabela 1 está no resultado da média.
A média de engajamento de Democracia, Diplomacia e Comunicação pública é respectivamente, 311, 308 e 316. Apesar da média não variar muito entre as variáveis, o engajamento de diplomacia (maior número de posts) é menor quando comparado com as demais, o que vai de contra com resultados anteriores no qual as questões diplomáticas possuíam mais engajamento (PERON, 2017). O principal dado dessa tabela é o engajamento de comunicação pública de Estado, isto é, questões como transparência e accountability, participação, prestação de serviços; movimenta mais os usuários que interagem com os posts do ministério no Facebook.
Portanto, essa análise primaria dos dados demonstra que a variável governo muda o conteúdo que é postado na Facebook pelo Ministério das Relações Exteriores. O engajamento em posts voltados para informações de Comunicação pública de Estado é maior do que diplomacia e democracia, contrapondo e corroborando com outras pesquisas da área.


Referências

ALMADA, M. P., Rossetto, G. N. P., & Carreiro, R. (2014). Diferentes objetivos, diferentes apropriações? O uso do Facebook por iniciativas civis de democracia digital no Brasil. Verso e Reverso, 28(68), 145-154.

KNIESS, Andressa Butture; MARQUES, Francisco Paulo Jamil. Como o agente fiscalizador utiliza a comunicação online? A ideia de transparência pública nas redes sociais da Controladoria-Geral da União. Opinião Pública, v. 27, p. 90-126, 2021.

MIOLA, Edna. MARQUES, F. P. J. Por uma definição de comunicação pública: tipologias e experiências brasileiras. Compolítica, Porto Alegre, 2017.

PERON, Vivian. Mídias sociais e diplomacia pública no Brasil e EUA: um estudo de diplomacia digital através do twitter. Compolítica, Porto Alegre, 2017.